Texto: Profissões: Um Lavador Muito Especial

PROFISSÕES: UM LAVADOR MUITO ESPECIAL

Lá se vão alguns anos desde o dia em que li a notícia. Mas nunca mais me esqueci do desabafo e da decepção do pobre brasileiro de olhinhos puxados que aparecia na fotografia do jornal, recém-chegado do Japão em uma leva de "dekasseguis" frustrados.

Com as crescentes dificuldades do Brasil, muitos descendentes de japoneses resolveram tentar a sorte na próspera terra de seus antepassados. Mas sem o treinamento e a educação dos nativos da terra, a maioria desses brasileiros tinha que se contentar com profissões mais duras, cargas de trabalho desumanas, sub-emprego.

Foi o caso do sansei da reportagem do jornal. Depois de ficar algum tempo desempregado, conseguiu finalmente uma vaga como Lavador de Lutador de Sumô. Sim, isso mesmo, Lavador de Lutador de Sumô. É uma profissão muito pouco concorrida no Japão - por motivos óbvios - e muito necessária. Afinal, na terra do Sumô, é fundamental que os pesados e banhudos lutadores estejam bem lavadinhos, com suas dobrinhas bem desodorizadas e sequinhas para não assarem e atrapalharem a próxima luta. E eles, por conta própria, não têm a mínima condição de tomarem banho sozinhos, lavar as pernas, pés, nem mesmo a genitália (que provavelmente só conseguem ver com o auxílio de um jogo de espelhos).

E lá se foi o nosso brasileiro, de jato d'água, sabão e esfregão em punho, ser o lavador oficial de um lutador de sumô. Uma profissão não somente ultrajante, mas também de alto risco. Um aperto mal dado na genitália de um brutamontes daqueles pode render um tabefe que vai colocar o pobre brasileiro a nocaute. E um escorregão do monstro - na hora de levantar o pé para lavar, por exemplo - pode representar a morte por esmagamento ou asfixia se ele cair em cima do lavador.

Pior do que trabalhar de Lavador de Lutador de Sumô, certamente deve ser morrer no exercício dessa profissão. Pelo menos desse fim nosso "dekassegui" escapou.

incluído em 04/09/2001